ENQUANTO OS DIAS PASSAM…
É bom viver nesta cidade, a terceira deste vasto território que, dentro de duas décadas, será um país independente. Ainda ninguém sabe, mas vai acontecer num futuro não muito distante...
Não fora o espectro da guerra que lavra lá para o Norte, e teríamos, aqui, uma vida perfeita.
A cidade é bonita. Na zona central existem largas avenidas, de sentido único, com separadores ao meio, ajardinados. Há lojas bem fornecidas, onde se encontra tudo o que é necessário para o dia a dia ; um grande mercado, com frutas variadas e legumes frescos, talho e peixaria; livrarias onde se podem encontrar os últimos livros publicados.
Esta vida fácil nem sempre é calma. De vez em quando –com demasiada frequência – recebemos notícias que nos abalam muito:
- A do soldado que, tendo terminado a sua comissão, regressava do mato a caminho desta cidade, onde faria escala para seguir para a capital, e daí para a sua terra natal. Em pleno voo, o pequeno avião em que vinha, sofreu uma avaria, despenhou-se, e aqui apenas chegaram os restos mortais, dentro de um caixão.
- Ou a notícia do acidente que sofreu o segundo comandante da base aérea. Acompanhou, voluntariamente, uma missão, onde acabou por perder a vida.
Era uma pessoa muito estimada por todos, incluindo civis, entre os quais contava muitos amigos.
A cidade inteira, em peso, acompanhou-o ao cemitério, para um último e forte abraço.
O corpo foi aí depositado, e mais tarde trasladado para o local do seu descanso eterno.
Foi uma cerimónia muito comovente. O capelão militar proferiu a alocução apropriada, terminando com um comovido “Até sempre, Tó”.
São apenas dois exemplos dos muitos a que vimos assistindo.
Foi este clima que me levou a decidir aceitar a proposta para produzir um programa, na rádio onde trabalho, dedicado aos soldados em combate.
É um trabalho fascinante. Como, diariamente, faço locução cinco horas, repartidas ao longo do dia, aproveito os tempos livres para preparar o programa que é transmitido uma vez por semana.
Começa com a voz de um locutor dizendo :
“O Emissor Regional do Norte do Rádio Clube de Moçambique apresenta (uma ligeira pausa) –
Mensagem ao soldado ! –um programa dedicado aos militares em serviço no norte de Moçambique”
A cidade é bonita. Na zona central existem largas avenidas, de sentido único, com separadores ao meio, ajardinados. Há lojas bem fornecidas, onde se encontra tudo o que é necessário para o dia a dia ; um grande mercado, com frutas variadas e legumes frescos, talho e peixaria; livrarias onde se podem encontrar os últimos livros publicados.
Esta vida fácil nem sempre é calma. De vez em quando –com demasiada frequência – recebemos notícias que nos abalam muito:
- A do soldado que, tendo terminado a sua comissão, regressava do mato a caminho desta cidade, onde faria escala para seguir para a capital, e daí para a sua terra natal. Em pleno voo, o pequeno avião em que vinha, sofreu uma avaria, despenhou-se, e aqui apenas chegaram os restos mortais, dentro de um caixão.
- Ou a notícia do acidente que sofreu o segundo comandante da base aérea. Acompanhou, voluntariamente, uma missão, onde acabou por perder a vida.
Era uma pessoa muito estimada por todos, incluindo civis, entre os quais contava muitos amigos.
A cidade inteira, em peso, acompanhou-o ao cemitério, para um último e forte abraço.
O corpo foi aí depositado, e mais tarde trasladado para o local do seu descanso eterno.
Foi uma cerimónia muito comovente. O capelão militar proferiu a alocução apropriada, terminando com um comovido “Até sempre, Tó”.
São apenas dois exemplos dos muitos a que vimos assistindo.
Foi este clima que me levou a decidir aceitar a proposta para produzir um programa, na rádio onde trabalho, dedicado aos soldados em combate.
É um trabalho fascinante. Como, diariamente, faço locução cinco horas, repartidas ao longo do dia, aproveito os tempos livres para preparar o programa que é transmitido uma vez por semana.
Começa com a voz de um locutor dizendo :
“O Emissor Regional do Norte do Rádio Clube de Moçambique apresenta (uma ligeira pausa) –
Mensagem ao soldado ! –um programa dedicado aos militares em serviço no norte de Moçambique”
É a minha deixa. Com voz que tento seja suave, digo:
“É para ti, (ligeira pausa) soldado, (ligeira pausa) que as minhas palavras e o meu pensamento vão, neste momento. (pausa)Sim, para ti, (ligeira pausa) exactamente para ti .(pausa)
Não sei se és cabo, furriel, ou oficial. Sei apenas que és (ligeira pausa) UM SOLDADO QUE DEFENDE A PÁTRIA (destacado). E é nessa condição que hoje te dirijo a palavra.
O começo é sempre igual. Segue-se conversa, respondendo às dezenas, se não centenas de cartas que recebo semanalmente.
Sei que o programa é muito bem acolhido, e à hora em que é transmitido, todos que podem ligam os rádios para ouvir. É o elo que os liga à vida normal. Sei que, ao ouvir-me, eles sentem como se eu falasse para cada um deles em particular. Ao responder às suas cartas é isso mesmo que faço.
O capelão, que regressou há pouco, confidenciou-me que este programa é um incentivo e até lenitivo para eles.
É gratificante saber que estamos ajudando alguém a ultrapassar momentos tão difíceis como estes.
As cartas que escrevem são enternecedoras. Transparecem as saudades imensas que sentem da família, da vida que deixaram tão longe, ao mesmo tempo que mostram confiança na vitória e no regresso tão desejado.
Termino o programa com a sensação de “dever cumprido”.
Regresso a casa para uma noite de sono.
Amanhã, às 7 horas, cá estarei novamente.
Este é mais um dos apontamentos que aqui apresentaremos, subordinados ao mesmo tema.
Não seguem qualquer ordem cronológica. Não estarão situados no tempo, nem no espaço.
O tempo é relativo. E as memórias afluem sem hora marcada.
Mariazita,
ResponderEliminarObrigado pela tua visita e comentário ao meu blog.
Quanto ao teu post, não há dúvida que relembrar África é lembrar tristezas e alegrias. Quem não conheçe sabe que perde a visão da miséria, mas também a visão da sua evolução e os prazeres do antigamente, completamente diferentes e apaixonantes na actualidade. África é o lembrar de muitos, sem conta, sentimentos, hoje ainda não esquecidos e com vontade de voltar.
É ainda hoje um desencadear de "histórias" felizes e outras amargas.
Bonito
Beijo
Querida Mariazita,
ResponderEliminarPáginas de um diário, apontamentos de uma realidade diferente, difícil, mas com o agradável sabor do «dever cumprido», de que muito foi feito com humanidade para serenar mentes preocupadas, para ajudar a viver mais plenamente os momentos pouco desejados.
Pessoalmente, não gosto de recordar tais tempos mas aprecio o seu relato, a sua escrita em perfeito português e com muita sensibilidade. Parabéns por este texto.
Beijos
A. João Soares
Olá, Sérgio
ResponderEliminarO teu comentário está em perfeita sintonia com o meu pensar.
Muitas coisas más se passaram, muitas coisas boas aconteceram...
Também eu gostaria de voltar.
Vamos recordando, já que recordar é viver.
Obrigada por teres vindo. Volta sempre.
Beijinhos
Mariazita
Meu querido João
ResponderEliminarMuito obrigada pelas suas palavras.
Houve, de facto, momentos muito difíceis, alguns, mas outros bastante gratificantes.
Apesar de tudo recordo-os com muita saudade.
Viveu-se intensamente o dia-a-dia, fizeram-se amizades que ainda perduram, ficaram as recordações!
Tenho mais alguns apontamentos destes.
Quando os publicar, aviso para o meu amigo não ver... :)
Beijinhos
Mariazita
Gostei de ler mais este relato...
ResponderEliminarO meu pai foi para Moçambique como tropa.
Beijinhos
Amiga!
ResponderEliminarSó agora vi o nome da fotografia, Nampula!!!
Eu conheço Nampula.
Estive várias vezes em Nampula.
O carro dos meus pais, quando viémos de Moçambique, foi despachado no porto de Nacala.
Eu fui com o meu pai fazer o despacho e regressámos de combioi e à boleia.
Beijinhos
Querida Mariazita
ResponderEliminarGrande e nobre tarefa.essa a que se propôs, enquanto esteve em África! Imagino o quanto esse programa era esperado por esses desenraizados,à força. Nessa altura, ou melhor, quando a guerra começou, eu era estudante e fazia uns quantos quilómetros de camionete até ao estabelecimento de ensino da minha Vila. Foram meus companheiros de viagem alguns soldados que se dirigiam para o Porto, para em seguida irem de barco rumo à Colónia a defender. Soube mais tarde que alguns, ao fazerem transbordo para o comboio, cometeram loucuras para morrer, pois o temor da guerra era imenso.
Os mais afoitos, viviam um dia de cada vez, sempre ajudados emocionalmente, deixe-me dizer assim, pelas madrinhas de guerra que diariamente lhes enviavam um aerograma.Eu fui uma delas e o meu alferes voltou são e salvo, (embora não por minha causa). Mass sei que o seu programa devia ser a maior força que eles poderiam receber. Bem haja pelo trabalho desenvolvido.
Um beijinho
Beatriz