quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

CONTO DE NATAL



 Para lerem aos vossos netos (ou filhos) ou para simples prazer da criança que há dentro de vós.

 BENVINDA e BALTAZAR


Numa aldeia distante morava um casal de velhinhos: A Benvinda e o Baltazar.

Embora fossem muito velhinhos e as forças já não fossem muitas, como eram muito pobres tinham de tratar das suas tarefas. 

Benvinda ocupava-se da lida da casa. Baltazar era chapeleiro, fabricava chapéus.

Naquele Natal não tinham nada para celebrar a consoada, nem dinheiro para comprar algo com que pudessem festejar a data do nascimento do Menino Jesus.

Baltazar lembrou-se de que talvez com a venda dos seus chapéus conseguisse algum dinheiro. Deslocou-se à cidade, pensando que, no regresso, poderia já trazer algumas guloseimas para se deliciarem à ceia.

Pegou em cinco chapéus que tinha feitos e tomou o caminho da cidade, que ficava bastante longe.

Depois de, com bastante dificuldade, atravessar vários campos, chegou, por fim, ao seu destino.

Sentia-se muito cansado mas, com a sua fé inabalável, pôs-se imediatamente a apregoar os chapéus:

- Olha o chapéu!  O lindo chapéu! Quem o comprar ganha o céu!

A cidade fervilhava de gente, que corria apressada de um lado para outro, fazendo as últimas compras para o Natal.

Todos voltavam para casa carregados de embrulhos, doces… garrafas de bebidas. Mas ninguém se interessava pelos chapéus.

Baltazar pensou:

- Não foi uma grande ideia, a que eu tive. Neste dia quem é que vai pensar em comprar um chapéu?

Mas não desistiu. Todo o dia palmilhou a cidade, apregoando a sua mercadoria. Pensava em Benvinda, que em casa o aguardava, e só isso lhe dava forças para continuar, apesar do enorme cansaço.

Mas não conseguiu vender um único chapéu.

A noite aproximava-se rapidamente e Baltazar, convencido de que não valia a pena insistir mais, guardou os chapéus e iniciou o caminho de regresso.

Quando saía da cidade começou a nevar. O frio entrava-lhe através da roupa, mas ele continuou a caminhar pelo campo coberto de neve.

De repente avistou seis duendes, todos encostados uns aos outros, tremendo. Já havia neve nas suas cabeças, que lhes respingava para os rostos.

Condoído, Baltazar não hesitou um momento. Passou a mão na cabeça dos duendes para retirar a neve, e em seguida cobriu-os com os chapéus, que não havia vendido.

Mas só tinha cinco chapéus, e os duendes eram seis…

Tirou o que ele próprio usava e com ele tapou a cabeça do sexto duende.

- É um chapéu velho e sujo… mas não tenho outro… - comentou Baltazar.

Não obteve qualquer resposta pois os duendes não falam com pessoas.

O velhinho retomou o seu caminho.

Ao chegar a casa a sua cabeça estava de tal modo branca com a neve que caíra, que Benvinda se assustou ao vê-lo:

- Mas o que aconteceu, Baltazar? Pregaste-me um susto! – disse, com voz trémula.

- A verdade é que não consegui vender nenhum chapéu. Quando regressava encontrei seis duendes e imaginei que estivessem com frio. Por isso cobri-os com os chapéus. Mas como faltava um… tapei-o com o meu.

Benvinda ficou emocionada com a atitude do marido, e apenas comentou:

- Foi um gesto muito nobre!

Comeram uns restos que ainda havia na despensa e foram-se deitar. A roupa da cama era pouca para noite tão fria. Encostaram-se o melhor possível, tentando transmitir um ao outro o calor dos seus velhos corpos cansados.

Pouco depois ouviram vozes lá fora:

- “Entrega de Natal! Onde é a casa do vendedor de chapéus? Abra a porta, vendedor!”

Levantaram-se ambos e abriram a porta, assustados.

Na frente da casa havia muita comida, doces, vinho, cobertores quentinhos…

Pensaram que estavam sonhando.

Olharam em volta e não viram ninguém. Fixando o olhar em frente, divisaram seis duendes afastando-se da casa.

Pareceu-lhes ouvir ao longe: - FELIZ NATAL!

Mas foi impressão, porque os duendes não falam com as pessoas.

Puseram a comida na mesa e festejaram, felizes.

No fim da refeição ajoelharam-se junto à lareira, puseram pelas costas um dos cobertores recebidos e, de mãos dadas, entoaram louvores ao Menino Deus que, ainda mal nascido, já fizera um tão grande milagre!

 

Maria Caiano Azevedo

 



quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

MOMENTO DE POESIA - AFINAL A VIDA É BELA


 AFINAL, A VIDA É BELA

Dias longos, sem sentido,

Difíceis de preencher.

Este que agora amanhece é mais um,

Igual a tantos outros.

Como dói a solidão!

Quem virá ver-me?

O telefone soará?

 

Sem vontade me levanto.

Forço-me a olhar para o espelho.

Vejo, reflectidos,  uns olhos assustados.

Examino as minhas rugas, uma a uma.

Tanta vida elas encerram!

Umas de felicidade - os sorrisos deixam marcas.

Outras de dor, dos momentos que sofri,

Da vida que não vivi.

Olho agora os meus cabelos,

Com lindos fios de prata.

Há uma saudade que mata,

Duma cabeleira farta,

Longa, brilhante, dourada.

Volto às rugas, curiosa.

Esta aqui, ontem não estava.

É a lembrança vivida

De toda a minha vivência.

 

Mais eis que um raio de sol

Atravessa, risonho, a vidraça da janela.

Beija-me o rosto,

Aquece-me o coração.

 

Afinal,

As minhas rugas são lindas,

As rugas da minha vida!

Memórias marcadas no meu rosto.

Sacudo os ombros.

Tomo café,

Visto um fato de treino.

Coloco a máscara no rosto,

E, por baixo,

Um mal disfarçado sorriso.

Saio para a rua, o sol brilha!

Caminho, quase saltitante.

E os ténis, confortáveis,

Pisando as pedras da calçada,

Dizem-me baixinho:

VAI EM FRENTE! A VIDA É BELA!

 

Maria Caiano Azevedo