Em frente à nossa casa, do lado de lá da estrada, a seguir ao “campo de batalha” dos cães, há um declive que termina junto ao mar.
Ali existe a “pomposamente” chamada Praia da Matiota.
Na realidade não há qualquer porção de areia, o que se pressupõe quando se usa o termo “praia”. Há apenas uns quantos rochedos com acesso ao mar, no qual, em dias de semana, damos agradáveis mergulhos.
Esta é a nossa praia de semana.
Estendemos as toalhas sobre os penedos e aí tomamos o nosso banho de sol.
Temos outra praia, muito boa, para os domingos… a Baía das Gatas. Noutra altura falaremos dela.
Aqui são as mulheres que trabalham nas casas dos “senhores do continente”.
Parecendo fazer parte da mobília, já se encontrava na casa uma cozinheira, uma mulher simpática, que, vim a descobrir, tinha um coração do tamanho do mundo.
Bondosa, extremamente carinhosa com as crianças, gostava muito de animais. Em pouco tempo trouxe-me para casa um cachorro, ainda pequeno, que conservei até regressar.
Nessa altura levou-o para sua casa. Com aquele enorme coração tinha mesmo que o adoptar, não o podia abandonar.
Nas traseiras havia um pátio murado, com umas casotas onde se podiam criar animais – galinhas, patos, talvez coelhos.
Luísa, a cozinheira, pediu-me para criar galinhas. Algum tempo depois havia uma quantidade de pintainhos, parecendo novelos de algodão, passeando pelo pátio, acompanhados da mãe galinha.
Crescem depressa, estes animaizinhos. Duas ou três semanas depois já não havia novelos de algodão, mas uns frangotes de pernas exageradamente altas para o corpo, onde despontavam penas de cores variadas.
Um dia a Luísa apareceu-me com um frangote nas mãos, dizendo:
- Senhora, este está doente, vai morrer.
- Mas que doença é que ele tem? – perguntei.
- Não sei como se chama a doença, mas é devida ao frio; quando eles a apanham não se aguentam em pé.
E, dizendo isto, colocou o animal no chão. De imediato ele dobrou as pernas pelo meio, quase como se ficasse sentado com as pernas para a frente. Não conseguia manter-se de pé.
Agarrei-o, e senti-o frio.
- Coitadinho! Mas ele está mesmo gelado!
Eu costumava usar em casa umas saias com uns bolsos grandes, que serviam para ir guardando pequenas peças dos brinquedos que as crianças deixavam caídas aqui e ali.
Meti o franguinho dentro do bolso, encostado ao meu corpo. Algum tempo depois já não estava tão frio.
À noite meti-o dentro duma caixa pequena, aconchegado num pano quente.
Apliquei-lhe este “tratamento” uma semana, talvez um pouco mais: de dia no meu bolso, à noite na caixa.
E o milagre (do calor, penso eu) aconteceu: o franguinho recuperou a saúde e tinha as pernas mais fortes de todos.
Entretanto tinha-o “baptizado” de Francisco.
Acreditem, se quiserem. Depois que saiu do meu bolso, o Francisco passou a seguir os meus passos por toda a casa, e à noite encaminhava-se prontamente para a sua “cama”, que estava, naturalmente, no meu quarto.
Fez-se um galo lindo, o Francisco! Com penas lustrosas, que pareciam envernizadas, um ar altaneiro, era mesmo o rei da capoeira!
Quando regressei ofereci-o à Luísa.