quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

PORQUE HOJE É DIA DE REIS…


Na escola de uma pequena aldeia, Professora e alunos preparam-se para celebrar o Dia de Reis.
No palco encontram-se, ao fundo, à esquerda, Maria e José, admirando seu filho.
   
Em primeiro plano o pastor está conversando em voz baixa com as ovelhas,







quando vê aproximarem-se a vaca e o burro. 











Dirige-lhes a palavra:
- Pastor - Ouve lá, ó vaquinha, o que estás aqui a fazer?
- Vaca - Vim esticar as pernas. Há tanto tempo naquela posição já quase não as sinto…
- Pastor - E tu, burrinho, porque estás aqui?
- Burro – Vim acompanhar a vaquinha. Nesta noite tão escura o perigo espreita a cada canto… E uma presença masculina sempre impõe um certo respeito! (levanta a cabeça, altivo)
- Pastor – Sendo assim, sentem-se junto a nós, e ouçam a história que eu estava a começar a contar às ovelhas.
A vaca e o burro sentam-se junto ao pastor.
- Ovelha A - De que nos vais falar hoje, pastor?
- Pastor – Do Natal…
- Ovelha B – Outra vez? Nesta altura do ano não falas doutra coisa…
- Ovelha C – Ela tem razão, pastor. Quando aparece aquela estrela brilhante só falas de Natal…
- Pastor – E qual é o problema? Vocês não gostam do que eu vos conto?
- Ovelha B – Não é isso, pastor! Não é que não gostemos… mas o Natal é sempre igual…
- Pastor – Engano vosso! O natal é sempre igual, mas sempre diferente.
- Ovelha A – Como assim? Como é que pode ser igual e diferente ao mesmo tempo?
- Pastor – É muito simples: é sempre igual porque a história, no fundo, é sempre a mesma; e é diferente porque os intervenientes variam, e cada um tem uma atitude e maneira de sentir e actuar diferentes…
- Ovelha C – Tudo bem, mas não vamos ficar aqui a noite toda a discutir… Portanto, pastor, conta lá a tua história…
- Pastor – Muito bem. Então prestem atenção. Vou contar-vos a história de um rei mago.
- Ovelhas (todas) – Oh! Não, outra vez os reis magos? Já ouvimos essa história centenas de vezes…
- Pastor – Penso que vocês estão enganadas. O que vou contar hoje é novo, ainda não vos falei em nada disto…
- Vaca – E se vocês se calassem e ouvissem o pastor? Muito gostam vocês de fazer barulho…
- Ovelhas – Méeééééééééééé´……
- Burro (em tom autoritário) – Calem-se, ovelhas, e deixem ouvir o pastor.
- Ovelhas, vaca e burro – Xiuuuuuuuuuuuuuuuu!
- Pastor – Ora vamos lá então. Vocês já ouviram muitas vezes falar nos três reis magos, certo?
- Animais em coro – Certo!!!!!!!!!!!!!!!!!!
- Pastor - E no quarto rei mago, ouviram falar?
- Todos – Não, nunca!
- Pastor – Pois este quarto rei mago chamava-se Artaban.
- Ovelha A - E ele também foi visitar o Menino?
- Pastor – Na verdade, não. Tal como aconteceu com os conhecidos três Reis Magos, também Artaban viu a estrela que anunciava o nascimento do Menino Deus.
- Vaca – Nesse caso, porque não seguiu o seu rasto?
- Pastor - Vários acontecimentos o impediram. Além de mago Artaban era astrónomo e médico, natural da Pérsia, e um homem muito rico que vivia num palacete rodeado de belos jardins de árvores exóticas e flores raras.
- Burro – Já estou mesmo a ver… Com tanta riqueza à sua volta que lhe importava uma estrela com um brilho diferente?
- Pastor – Estás completamente enganado! Na verdade, ao ver a estrela brilhante, Artaban desfez-se de parte dos seus haveres e, preparando o seu melhor cavalo, partiu de madrugada para, no dia marcado, se encontrar com os seus amigos Gaspar, Melchior e Baltazar, que, de acordo com o combinado, já se encontravam a caminho.


Levava consigo três jóias para oferecer ao Messias: uma pérola, um rubi e uma safira.
Precisava cavalgar sem parar – já estava escurecendo e ainda faltavam mais ou menos três horas de viagem para chegar ao local do encontro. Teria que estar lá antes da meia-noite, pois a partir dessa hora os três Reis Magos não esperariam mais por ele.
De súbito, numa curva da estrada, o cavalo assustou-se com algo que viu sob o reflexo da lua: era um homem que já apresentava o frio da morte.
Artaban, depois de o examinar, deu-o como morto, e, com o coração triste, voltou-se para partir. Mas, ao levantar-se, sentiu a mão do homem prendendo-lhe o manto.
- Os animais, em coro – Deve ter apanhado um grande susto…
- O pastor – Naturalmente que sim. Mas, apesar de já se fazer tarde para o encontro com os seus amigos – era preciso seguir a estrela! – decidiu socorrer o hebreu, tratando-o por várias horas, até ele se recuperar.
Por fim, deixando com ele as suas provisões e curativos, retomou o seu caminho.
Quando chegou ao lugar combinado, não encontrou mais os seus companheiros. Nem sinal da caravana de camelos. Então, num monte de pedras, ele achou um pergaminho com a seguinte mensagem:
“Artaban, não pudemos aguardar-te mais; prosseguimos ao encontro do Messias. Esperamos que nos sigas através do deserto.”
Artaban entrou em desespero... Como poderia atravessar o hostil deserto sem ter o que comer e com um cavalo cansado? Assim, regressou à Babilónia, vendeu a sua pedra de safira, e comprou camelos e provisões suficientes para a longa viagem.
- Ovelha A – Coitado! Depois teve que viajar sozinho, não foi, pastor?
- Pastor – Sim, é verdade, mas a sua vontade de encontrar o Messias era muito grande. Por isso continuou a sua jornada pelo deserto e finalmente chegou a Belém, mas deparou-se com a vila deserta.
Pela porta entreaberta duma humilde casa ouviu a voz duma mulher que cantava suavemente. Entrou e encontrou uma jovem mãe acalentando o seu filhinho, que lhe falou nos três reis magos que haviam passado pela vila e tinham seguido, guiados por uma estrela, para o lugar onde encontrariam José de Nazaré, sua esposa Maria e o bebé Jesus.
 O bebé daquela mulher olhou para Artaban, sorriu e estendeu os bracinhos para ele. Foi quando se ouviram gritos e grande correria lá fora, nas ruas.
Os soldados de Herodes estavam matando as criancinhas.
- Os animais, em coro – Que horror! Que homens tão maus!
- Pastor – Tendes toda a razão. Mas deixai-me continuar…A jovem mãe, branca de terror, escondeu-se no canto mais escuro da casa, cobrindo o menino com o seu manto para que ele não chorasse e fosse descoberto pelos soldados.
Artaban colocou-se no vão da porta, impedindo a entrada dos soldados. Um oficial aproximou-se para afastá-lo; o mago, aparentada uma falsa calma, disse-lhe que estava sozinho, esperando a oportunidade para oferecer uma jóia àquele que deixasse a casa em paz; e, dizendo isto, mostrou-lhe o rubi brilhando na palma da mão.
Com os olhos ardendo de cobiça o oficial arrebatou a jóia, gritando para os soldados que ali não havia nenhuma criança. Artaban, olhando para o céu, pediu que lhe fosse perdoado o seu pecado, já que dissera uma mentira.
- Vaca – Com certeza que lhe foi perdoado, e nem sequer era pecado, só mentiu para salvar o bebé… não achas, pastor?
- Pastor – Claro que sim, vaquinha. Artaban mentiu para salvar uma vida.
Mas, continuemos. Assim, das três dádivas que trouxera para oferecer ao Messias, já se desfizera de duas. Começava a achar-se indigno de algum dia contemplar a face do Menino Deus.
Mas continuou a sua jornada. Passou por lugares onde a fome era grande; cidades onde os enfermos morriam na miséria; visitou oprimidos nas cadeias, e escravos nos mercados. Num mundo cheio de angústia e sofrimento não encontrou ninguém para adorar, mas muitos desgraçados para ajudar.
E os anos passaram, 33 anos… Os cabelos de Artaban já estavam brancos. Velho, cansado, e pronto para morrer, ele ainda continuava à procura do Rei de Israel.
Estava de novo em Jerusalém, por onde havia passado muitas vezes na esperança de encontrar a Sagrada Família.
A população estava reunida na cidade santa para a festa da Páscoa do Senhor.
Vendo uma grande agitação, Artaban perguntou, a um grupo de pessoas, o que se passava e para onde se dirigiam.
- Vamos para o Gólgota. Dois ladrões vão ser crucificados e com eles um homem chamado Jesus de Nazaré, que dizem ter feito coisas maravilhosas entre o povo; mas os sacerdotes acusam-no de ter dito ser o Filho de Deus, e condenaram-no à morte.
Artaban achou que era chegada a altura de oferecer a sua pérola para salvar Jesus da morte.
Ao seguir a multidão viu um grupo de soldados arrastando uma jovem toda ensanguentada que, conseguindo libertar-se, se ajoelhou perante ele, implorando auxílio. Disse-lhe que seu pai era mercador na Pérsia, mas falecera cheio de dívidas, e que agora aqueles homens iam vendê-la como escrava para saldar os débitos de seu pai.
Artaban tremeu perante o conflito entre a Fé, a Esperança e o impulso do Amor. Só lhe restava a preciosa pérola. O que fazer? Tirou a pérola do seu alforge e colocou-a na mão da jovem, dizendo-lhe que pagasse aos seus algozes. Assim ela foi libertada.
Logo o dia se transformou em noite profunda e um forte tremor de terra abalou a cidade.
Artaban, na companhia da jovem libertada, foi atingido na cabeça por uma pedra.
Com o sangue a escorrer do ferimento, descansou a cabeça no colo da jovem; preparando-se para morrer pediu perdão por não adorar o Messias e lhe ofertar o presente que trouxera de tão longe. Durante 33 anos ele havia procurado Jesus, mas nunca vira a face Dele!
Então ouviu uma suave voz vinda dos céus:
“Artaban! Sempre que viste um enfermo, prestaste-lhe socorro; quando avistaste alguém com fome, deste-lhe de comer; sempre que encontraste alguém com sede, deste-lhe de beber; sempre que viste alguém acusado injustamente, deste-lhe a liberdade. Em verdade, quando fizeste tudo isso, foi a Mim que o fizeste!”
Uma alegria enorme iluminou o seu rosto. Com um profundo suspiro, terminou a sua longa viagem de 33 anos.
O quarto mago, finalmente, encontrara o seu Rei!

Olhando em redor o pastor notou, comovido, que todos os animais tinham os olhos marejados de lágrimas.
E disfarçando a sua própria comoção, perguntou:
- Pastor - Então, gostaram da história de Artaban?
- Todos os animais - Sim! - responderam em coro. Foi a história mais bonita que alguma vez nos contaste.
- Pastor - Ainda bem que gostaram. E acrescentou, com a voz entrecortada de emoção:
Mas agora já se faz tarde. Vaquinha e burrinho, vão já para junto do Menino, que deve estar enregelado. E vós, ovelhas, todas atrás de mim, rápido, que o redil está longe!

Texto de Mariazita