Quando eu era estudante no colégio, interna, ansiava pelas férias para ir para casa dos meus pais. O período mais desejado era o das férias grandes, três longos meses em que não pensava em livros nem cadernos, e o tempo voava entre brincadeiras, passeios de bicicleta, encontros com as amigas de infância…
Nesta altura eu andava pelos onze, doze anos, mas, ainda adorava ouvir contar histórias.
Lá em casa havia uma criada que sabia muitas histórias, que contava com grandes pormenores, e faziam as minhas delícias.
À noite, depois de jantar, quando apanhava os meus pais distraídos a ouvir rádio (naquele tempo ainda não havia televisão…), esgueirava-me para a cozinha onde a criada, a Conceição, se encontrava lavando e arrumando a loiça.
Quando ela me via sorria – já sabia ao que eu ia, e tinha um prazer especial em me contar aquelas histórias rocambolescas, que eu ouvia de olhos arregalados, e às vezes me faziam ter pesadelos, como aquela…
“Era uma vez uma bruxa que se casou com um sapateiro que vivia noutra terra. Ele não sabia que ela era bruxa, nem mesmo as suas vizinhas o sabiam.
Alguns dias depois de casados, numa sexta feira de lua cheia, foram deitar-se, como de costume, e pouco depois o homem adormeceu. Sem saber porquê, pouco tempo depois de ter adormecido acordou, com uma sensação estranha. Estendeu o braço e verificou que o lugar ao seu lado estava vazio.
Intrigado e até certo ponto preocupado, receando que a sua mulher estivesse passando mal, levantou-se e foi procurá-la. Mas não a encontrou em nenhum canto da casa. E pensou:
- Onde é que aquela mulher foi a uma hora destas?
Sem encontrar resposta, meteu-se na cama mas manteve-se acordado. Nem conseguia dormir a pensar onde é que sua mulher podia ter ido. A certa altura saiu da cama e sentou-se no escuro, para a surpreender quando ela chegasse.
Pela madrugada ouviu um ligeiro ruído na cozinha, e, assombrado, viu a sua mulher desmontar da vassoura e colocá-la no seu lugar. Meteu-se precipitadamente na cama.
A mulher veio pé ante pé, e, fazendo os gestos mínimos para não o acordar, deitou-se. O marido, que fingia dormir, manteve-se quieto até à hora de se levantar.
No dia seguinte esperou que a mulher lhe explicasse o que andara a fazer; mas ela manteve silêncio em relação à noite anterior. E ele não fez perguntas. Mas passou a estar atento todas as noites.
Na noite de lua cheia seguinte, depois de se deitarem, rapidamente o marido fingiu dormir. Com todas as cautelas a mulher levantou-se, no que foi de imediato seguida pelo marido, no maior silêncio, e às escuras. Só na cozinha a mulher acendeu uma pequena lamparina.
Escondido, o homem viu a mulher pegar numa vassoura, montá-la, e dizer:
- Por cima da folha vai! – e logo de seguida subir pela chaminé e desaparecer dos seus olhos.
Sem pensar duas vezes o homem agarrou noutra vassoura, pôs-se em cima dela, e pronunciou, com convicção:
- Por cima da folha vai – e imediatamente foi arrebatado pelos ares.
Sobrevoou árvores e arbustos até que acabou por “aterrar” numa clareira dum denso pinhal. Escondendo-se atrás dum pinheiro, ficou boquiaberto com a cena que se desenrolava ante os seus olhos:
Numa cadeira semelhante a um trono encontrava-se o diabo, com uns pequenos “cornichos”, e um manto vermelho sobre um fato de malha preto. À sua volta pequenos diabinhos tocavam uma música infernal, e em frente, na clareira, cerca de vinte ou trinta bruxas dançavam com um entusiasmo diabólico.
A certa altura o diabo levantou-se do seu trono e colocou-se no centro da roda de dança. Baixando as calças e inclinando-se para a frente, pôs o rabo à mostra.
As bruxas, uma a uma, sem perderem o ritmo da dança, iam passando junto ao diabo e, inclinando-se, davam-lhe um beijo no rabo.
O homem, por ser sapateiro, andava sempre com uma sovela no bolso. Ao ver aquele espectáculo ficou indignado, e resolveu vingar-se.
Introduziu-se na roda de dança e, quando chegou a sua vez, retirou a sovela do bolso e espetou-a no rabo do diabo. Este deu um salto, e gritou:
- Arre, que esta tem as barbas rijas!"
Esta era uma das muitas histórias, sempre de bruxas, que a Conceição me contava.
Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay
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