quinta-feira, 30 de outubro de 2008

UM PASSEIO À NORUEGA

Tenho uma caixa (na verdade é mais um pequeno caixote de cartão) onde vou colocando coisas para mais tarde arrumar nos seus devidos lugares.
Ontem olhei para ela de soslaio e pensei: está na hora de dar aqui uma volta, antes que isto transborde…

No meio de vários papéis a aguardarem arquivo, encontrei umas fotografias para intercalar no álbum de fotos dum passeio que dei à Noruega. Ao vê-las “revi” aquela maravilhosa viagem, e várias peripécias que aconteceram.
Há sempre inúmeras histórias para contar, das viagens. Esta que vou partilhar convosco parece-me bastante interessante. Eu chamar-lhe-ia “uma história de contrastes”.

Há três ou quatro anos fui visitar a Noruega na companhia de um grupo de bons amigos.
Saímos de Lisboa em meados de Julho, rumo a Oslo, a capita. Aí premanecemos dois dias, visitando a cidade e seus monumentos, e, como não podia deixar de ser, o famoso Parque Frogner.

Dentro deste parque existe uma exposição permanente de cerca de 200 estátuas e outras obras de arte do escultor norueguês Gustav Vigeland. (por isso é também conhecido por Parque Vigeland)

Este escultor dedicou a maior parte da sua obra ao culto Homem/Mulher, inspirando-se muitas vezes na mitologia grega e também na Bíblia.

A entrada do Parque é ladeada por grande quantidade de esculturas, todas subordinadas aos temas “Homem/Mulher, “Fertilidade”, e “Natureza”




















Não vou alongar-me muito em pormenores. Descrever um passeio de duas semanas daria para escrever um livro…e não é neste espaço que pretendo fazê-lo.

Continuamos viagem para norte. A Noruega é um país lindíssimo, com paisagens maravilhosas, muito diferentes do que vemos habitualmente.

Chegamos a um ponto do nosso percurso que incluía um passeio, a pé, com duração prevista de 4 horas, a uma formação rochosa chamada “Preikestolen”.
Antes de iniciarmos a caminhada o guia forneceu-nos um folheto que dizia:

Visita ao PREIKESTOLEN
Visita a uma curiosidade natural única, considerada como o observatório mais famoso de toda a Escandinávia. A enorme coluna rochosa PREIKESTOLEN cai vertiginosamente a pique, 600 metros, nas águas do Lysefiord. Não tem qualquer acesso por estrada, logo, só é possível realizar esta visita a pé. É necessário levar calçado adequado, pois a caminhada dura cerca de 4 horas, por caminho bastante irregular.

Os organizadores do passeio “esqueceram-se” de informar que:
- Parte do trajecto é feito caminhando de lado, agarrados a correntes de ferro presas nas rochas.
- Há uma inclinação, no sentido descendente, de tal modo íngreme e escorregadia que temos que deslizar acocorados em cima dos calcanhares, agarrados a lianas.
- Quase todo o percurso é feito sobre pedras soltas, como se pode ver na foto seguinte.

Não há quaisquer indicações ou mapas, excepto essas marcas vermelhas (como a que se vê na foto), que nos “dizem” qual é a rocha seguinte…

Mas todo o esforço se dá por bem empregue quando se atinge o topo.
A sensação é a de que se está mesmo no topo do mundo!


(As fotos seguintes não foram feitas por mim, é claro. São reproduções de cartões postais)





















Depois de apreciar a maravilhosa paisagem que se desfruta lá de cima, de encher os pulmões daquele ar puríssimo e de tirar imensas fotografias, iniciamos o regresso.

Agora no sentido descendente, muito mais fácil do que a subida, alguns metros decorridos, inexplicavelmente caí, fiz uma entorse tíbio-társica no pé direito, que me impossibilitou de caminhar.
Num piscar de olhos o tornozelo começou a inchar e as dores a tornarem-se insuportáveis.
Amavelmente, os meus companheiros de viagem tentaram ajudar. Tarefa inglória! Naquele trecho do caminho só cabiam os pés de uma pessoa de cada vez.
Depois de várias tentativas, - um à minha frente dando-me um braço para eu me apoiar, outro atrás de mim fazendo a mesma coisa - acabamos por desistir.
Começamos a pensar em qual seria a melhor forma de me retirarem daquele local.
Para se sair dali, sem poder andar pelo seu pé…só com asas. É impossível qualquer tipo de socorro por terra
Eu já me imaginava a passar a noite, que se aproximava, naquele local desabrigado. Comecei a ficar seriamente preocupada.
Mas…os deuses estavam por mim!
Cruzou-se connosco um jovem casal de noruegueses, que ia a subir, e, ao ver-me amparada e parada, com um pé no ar, perguntaram se precisávamos ajuda.
Contamos o que tinha acontecido, e como estávamos aflitos sem saber como resolver aquela situação.
Foi quando soubemos, por eles, que existe um serviço de assistência de helicóptero para casos semelhantes, quer se esteja no Preikestolen quer em qualquer outro local de difícil acesso, em qualquer ponto da Noruega.
De posse do número de telemóvel que eles nos forneceram, chamou-se um helicóptero que me transportou ao hospital – ambos os serviços, transporte e assistência hospitalar completamente grátis !!!


(Ao fundo, o helicóptero que me evacuou. Ninguém me pôde acompanhar; no heli só havia espaço para mim, ( nesta altura já estava lá dentro) além dos paramédicos. A imagem não é muito boa; foi retirada do filme que um amigo fez de toda a viagem).

No hospital recebi assistência médica, e de lá regressei em cadeira de rodas que, ao fim de 2 ou 3 dias, foi substituída por canadianas.
Com elas fiz o resto da viagem pela Noruega, e com elas regressei a Lisboa.

Apanhamos o avião de regresso a Lisboa em Estocolmo, Suécia, fazendo escala, com mudança de avião, em Frankfurt, Alemanha.
Pelo facto de vir de canadianas tive tratamento VIP nestes 2 aeroportos, de Estocolmo e da Alemanha.
Quem conhece o aeroporto de Frankfurt sabe que as suas dimensões são impressionantes.
Quem tiver que fazer transbordo tem que percorrer uma distância enorme!
Como eu estava lesionada, transportaram-me num carrinho eléctrico (o marido aproveitou a boleia…)
Viajei em 1ª.classe, (para grande inveja dos meus amigos companheiros de viagem…) e a bordo encheram-me de mimos! Até nos ofereceram champanhe! E, depois de nos fornecerem ementa para escolhermos o almoço, e termos almoçado, serviram-nos um belo café acompanhado de bombons de chocolate!

Claro que à chegada ao aeroporto de Lisboa nem uma cadeira tive para me sentar!!! A solução foi aguardar a saída das bagagens apoiada às canadianas.
Aí caímos na realidade… do 3º.mundo !!!

domingo, 26 de outubro de 2008

O MEDO

Há quem defenda que o recém-nascido “traz” consigo dois medos – o medo do barulho e o medo de cair.
De facto, se expusermos um bebé a um ruído forte, verificamos que ele se agita, inquieto. E, se simularmos deixá-lo cair, o bebé encolhe-se e pode, eventualmente, dependendo da intensidade do susto, até chorar.

A psicologia diz-nos que a maioria dos medos que nos acompanham são adquiridos na infância, quase sempre incutidos pelos pais e educadores, ou como resultado de qualquer experiência traumática.

Dominados pelo medo podemos cometer actos irreflectidos, por vezes funestos.

Epicuro, filósofo grego (341 a 241 a.C.), cuja vida foi marcada pela serenidade e doçura, entendia que o essencial para a felicidade era uma vida tranquila, cercado de amigos, em completa ausência de dor e de medos.
“A representação vulgar do mundo com os seus deuses, o medo dos quais fez com que se cometessem os piores actos, é obstáculo à serenidade”.
“Para encontrar a felicidade o homem precisa aprender a superar os seus temores, até mesmo o da morte”.

Actualmente a psicologia divide os medos em normais e irracionais.
Normal é o medo que nos previne do perigo: ter medo de nos atirarmos da janela para saber qual a sensação de voar; ter medo de ser assaltado; ter medo de desafiar os mais fortes e depois sofrer represálias...
Ao medo do perigo associa-se o desejo de sobrevivência, o que torna este tipo de medo normal.

Irracional é o medo que nos domina completamente, nos leva a alterar hábitos e rotinas, que nos escraviza.

A melhor forma de combater os medos é enfrentá-los.
Não é fácil. Normalmente é até muito difícil; e, para o conseguir há que, muitas vezes, recorrer à ajuda de especialistas.

O medo mais comum é, sem dúvida, o medo do desconhecido.
Postos perante o desconhecido, nem sempre optamos pela melhor solução.

A PORTA NEGRA

Era uma vez um país de Mil e Uma Noites.
Neste país havia um rei que era muito polémico por causa dos seus actos.
Levava os prisioneiros de guerra para uma grande sala.
Os prisioneiros eram enfileirados no centro da sala, e o rei gritava:
- Eu vou dar-vos uma chance. Olhem para o canto direito da sala.
Ao olharem, os prisioneiros viam alguns soldados armados de arco e flechas, prontos para a acção.
- Agora, - continuava o rei – olhem para o canto esquerdo.
Ao olharem, todos os presos notavam que havia uma terrível Porta Negra, de aspecto dantesco.
Crânios humanos serviam como decoração, e a maçaneta era a mão de um cadáver.
Algo horripilante só de imaginar, quanto mais para ver.
O rei posicionava-se no centro da sala e gritava:
- Agora escolhem. O que é que vocês preferem? Morrerem cravados de flechas ou abrirem rapidamente aquela Porta Negra e entrarem lá dentro enquanto eu vos fecho lá?
Decidam. Vocês têm livre arbítrio. Escolham!
Todos os prisioneiros tinham o mesmo comportamento: na hora da decisão eles chegavam junto da terrível Porta Preta de mais de quatro metros de altura, olhavam para os desenhos de caveiras, sangue humano, esqueletos, aspecto infernal, coisas escritas do tipo “ Viva a morte”, etc., e decidiam: Quero morrer flechado.
Um a um todos agiam assim: olhavam para a Porta Negra e para os arqueiros da morte e diziam para o rei:
-Prefiro ser atravessado por flechas a abrir essa Porta Negra e ser trancado lá dentro.
Milhares optaram pelo que estavam vendo – a morte feia pelas flechas.
Um dia, a guerra acabou.
Passado algum tempo, um daqueles soldados do “Pelotão da Flechada” estava varrendo a enorme sala quando surgiu o rei.
O soldado, com toda a reverência e meio sem jeito, perguntou:
- Sabe, ó grande rei, eu sempre tive uma curiosidade… Não se zangue com minha pergunta, mas…o que tem além daquela Porta Negra?
O rei respondeu:
- Lembras-te que eu dava aos prisioneiros duas escolhas? Pois bem, vai e abre a Porta Negra.
O soldado, trémulo, rodou cautelosamente a maçaneta e sentiu um raio puro de sol beijar o chão feio da enorme sala. Abriu mais um pouquinho a porta, e mais sol e um gostoso cheirinho de verde inundaram o local.
O soldado notou que a Porta Negra abria para um caminho que apontava para uma grande estrada.
Foi então que o soldado percebeu: a Porta Negra dava para a Liberdade.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

SINCERIDADE

Já aqui falamos várias vezes de Amor, Amizade, e, pelo menos afloramos, muitos outros sentimentos.
Hoje vamos debruçar-nos sobre a “Sinceridade”.
Comecemos por ver o que nos diz Malba Tahar sobre a origem da palavra «sincera».

A ORIGEM DA PALAVRA SINCERA

Sincera é uma palavra doce e confiável.

Sincera é uma palavra que acolhe.

E essa é uma palavra que deveria estar no vocabulário de toda a gente.

Sincera foi uma palavra inventada pelos romanos.

Sincero vem do velho, do velhíssimo latim…

Eis a poética viagem que fez “sincero” de Roma até aqui:

Os romanos fabricavam certos vasos de uma cera especial.
Essa cera era, às vezes, tão pura e perfeita, que os vasos se tornavam transparentes.
Em alguns casos chegava-se a distinguir um objecto – um colar, uma pulseira ou um dado – que estivesse colocado no interior do vaso.

Para o vaso, assim fino e límpido, dizia o romano vaidoso:
- Como é lindo! Parece até que não tem cera!
“Sine-cera” querida dizer “sem cera”, uma qualidade de vaso perfeito, finíssimo, delicado, que deixava ver através das suas paredes.

Da antiga cerâmica romana, o vocábulo passou a ter um significado muito mais elevado.

Sincero é aquele que é franco, leal, verdadeiro; que não oculta, não usa disfarces, malícias ou dissimulações.

O sincero, à semelhança do vaso, deixa ver, através de suas palavras, os nobres sentimentos de seu coração.


A maioria dos escritores e pensadores manifestaram, ao logo dos tempos, a sua opinião acerca da sinceridade.
Vejamos alguns exemplos:

André Gide, conhecido escritor francês, autor de inúmeros livros e Prémio Nobel de Literatura de 1947, disse:

“Não se pode, ao mesmo tempo, ser sincero e parecê-lo”

“Em geral consideram-se sinceros todos os rapazes com convicções, e incapazes de criticar”

Por seu lado, François La Rochefoucaud, também escritor francês, pensava:

“A sinceridade é uma abertura do coração. Encontramo-la em muito poucas pessoas, e essa que vulgarmente por aí se vê, não passa de uma astuta dissimulação para atrair a confiança alheia”.

“As pessoas fracas não podem ser sinceras”.

“Alguma desconfiança que tenhamos da sinceridade de quem nos fala, não impede que julguemos sempre que são mais sinceros connosco que com os outros”

E, por último, vejamos o que pensava da sinceridade o nosso Fernando Pessoa:

“Nunca sabemos quando somos sinceros. Talvez nunca o sejamos. E mesmo que sejamos sinceros hoje, amanhã podemos sê-lo por coisa contrária”.

“Quando falo com sinceridade, não sei com que sinceridade falo. Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe”.

“Custa tanto ser sincero quando se é inteligente! É como ser honesto quando se é ambicioso”.

“No teatro da vida quem tem o papel de sinceridade é quem, geralmente, mais bem vai no seu papel”.

“Toda a sinceridade é uma intolerância. Não há liberais sinceros. De resto, não há liberais”.

Sem quaisquer pretensões a escritora ou pensadora…"penso" que a sinceridade deve ser usada com conta, peso e medida.
Quantas vezes, por uma questão de piedade, não podemos ser completamente sinceros?
E também, às vezes, por uma questão de prudência, temos que calar a verdade sincera, porque:

“Quem diz o que quer ouve o que não quer”!

domingo, 19 de outubro de 2008

AMOR E LOUCURA

Em tempos passados existiram duas crianças, um menino e uma menina, que tinham entre quatro e cinco anos de idade.
O menino chamava-se Amor e a menina Loucura.

O Amor sempre foi uma criança calma, doce e compreensiva.
Já a Loucura era muito emotiva, passional e impulsiva, enfim, do tipo que jamais levava desaforo para casa.

Entretanto, apesar de todas as diferenças, as crianças cresciam juntas, inseparáveis, brincando, brigando...


Mas houve um dia em que o Amor não se sentia muito bem, e acabou respondendo às provocações de Loucura, com a qual teve uma discussão muito feia.

Ela não deixava nada barato, estava furiosa como nunca com o Amor. Começou a agredi-lo, mas não só verbalmente, como de costume.
A menina estava tão descontrolada que agrediu o garoto fisicamente, e, antes que pudesse perceber, arrancou os olhos do Amor.

O Amor, sem saber o que fazer, chorando, foi contar à sua mãe, a deusa Afrodite, o que havia acontecido.
Inconsolada, Afrodite implorou a Zeus que ajudasse seu filho, mas que não castigasse Loucura.

Zeus, por sua vez, ordenou que chamassem a garota para uma conversa.

Ao ser interrogada, a menina respondeu, como se estivesse com toda a razão, que o Amor a tinha aborrecido, e que foi merecido tudo o que aconteceu.

Embora soubesse que não fora justa com o seu amigo, a menina, que nunca soube desculpar-se, concluiu dizendo que a culpa havia sido do Amor e que não estava nem um pouco arrependida.

Zeus, perplexo com a aparente frieza daquela criança, disse que nada poderia fazer para devolver a visão do Amor, mas ordenou que Loucura ficasse condenada a guiá-lo por toda a eternidade, estando sempre junto ao Amor, em cada passo que este desse.

E, até hoje, eles caminham juntos: onde quer que o Amor esteja com ele estará Loucura, quase que fundidos um no outro.
São tão unidos que por vezes não se consegue definir onde termina o Amor e onde começa a Loucura.

É também por isso que se costuma dizer que o Amor é cego; mas isso não é verdade, pois o Amor vê com os olhos da Loucura.

Autor desconhecido

Veja o vídeo

O AMOR É LOUCO...

Canção. Intérprete: Carlos Ramos.


quinta-feira, 16 de outubro de 2008

BALADA PARA OUTRAS ISABELLAS

Olá! Eu vim lhe contar um pouco da minha história...
Peço atenção, seu “dotô”, um instante, não demora...

Meu nome não é Isabella nem “caí” de uma janela do quarto no sexto andar...(será que pensaram, os insanos, que ela sabia voar?)

Não moro num prédio equipado, não tenho motos, brinquedos, nem piscina pra nadar...
Eu brinco, às vezes, nas poças de chuva, com gatos, latinhas, bolinhas de gude...isso quando não tenho que a mãe ajudar...

Não sei dançar, e não brinco como menina educada, porque aprendi, desde cedo, lá no morro onde nasci, que não importa o sexo da criança: menino ou menina, a experiência, é viver o teatro da sobrevivência...

Não me chamo Isabella... nem fui morta (ainda) por meu pai ou madastra...mas morro um pouco, a cada dia, quando sou espancada.
E morro também,assim, engasgada, obrigada a me calar quando tenho mãos sobre mim...nem sempre a me sufocar, mas explorando, de um jeito esquisito, que nem entendo direito,no meu corpo sem contornos...

Meu nome ,não é Isabella...
Não tenho cabelos lisos,nem tenho olhinhos espertos...
Ao contrário: meus olhos são opacos, talvez, por não querer enxergar
minha dura realidade...

Também não faço teatros, lá no palco da escolinha... isso não é para mim...
Quando vou à escola, é somente p’ra comer a merenda que me dão... pois muitas vezes, em casa, não temos sequer o pão...

O máximo que sei é correr: morro abaixo, morro acima, entre os carros dos sinais...para ganhar um trocado, ou para fugir dos adultos, que insistem em me machucar...

Eu não me chamo Isabella...mas, como ela, (ou até mais!) eu sofro... e diariamente...
Tenho marcas de pancadas, queimaduras de cigarros, tenho ossos fraturados, boca sangrando, hematomas, que mãos e pés gigantescos
me provocam sem motivo...

Não morri, como Isabella...
Ainda não... mas irmãos, amiguinhos, conhecidos, eu sempre vejo morrer...
Quem matou? Nunca se sabe...”ele caiu”, “tropeçou”,”queimou-se por acidente”.
“Estrupada?”, “coitadinha”...
“Não fui eu”, diz o padrasto; “nem eu”, diz a mãe omissa...
E eles não têm nem quem reze para eles, uma missa...

Eu não me chamo Isabella...sou Maria, Rita, João…
Sou Josefina, sou Mirtes, sou Paulo, Sebastião...
Sou tantas, tantas crianças, que todo dia a omissão de todos deixa morrer...



Engraçado é que ninguém, faz passeata por mim, a imprensa não divulga, o “figurão” não se importa, a classe média não grita, os ricaços dão de ombros...
Que hipocrisia é essa, de chorar por uma só?
São tantas as Isabelas violentadas sem dó...

Mas que importam os escombros, a escória da sociedade?

Se não me chamo Isabella, não mereço piedade.

Recebi por email, de um amigo brasileiro.
Sem comentários!

domingo, 12 de outubro de 2008

RECORDANDO UMA ESTRELA

Passaram-se 20 anos desde que se apagou mais uma estrela no firmamento musical português – Carlos Paião.
Foi no dia 26 de Agosto de 1988 que uma “das maiores e mais queridas estrelas do mundo da música portuguesa” nos deixou para sempre.

Dirigia-se para Leiria, onde iria actuar num espectáculo, quando foi surpreendido pela morte, num violento acidente de viação.

Noticia da Morte de Carlos Paião RTP Jornal de Sabado 1988



Em breve se gerou em torno da sua figura o boato de que não estaria morto na altura do seu funeral, mas sim em coma. A verdade é que a violência do acidente não permitiria a sobrevivência fosse de quem fosse, mas o boato mantém-se extremamente arreigado até aos dias de hoje.

Nascido em Coimbra a 1 de Novembro de 1957 passou a maior parte da sua juventude entre Ílhavo e Lisboa, tendo-se licenciou em Medicina pela Universidade de Lisboa, em 1983.

Pouco depois decidiu dedicar-se exclusivamente à música, para a qual, desde muito jovem, mostrava particular aptidão. Com apenas 23 anos de idade tinha já composto mais de 200 canções.

Em 1981, Carlos Paião decidiu enviar algumas delas ao Festival RTP da Canção, numa altura em que este certame representava uma plataforma para o sucesso e a fama no mundo da música portuguesa.
"Play-Back", a canção seleccionada, ganhou o Festival RTP da Canção, com a esmagadora pontuação de 203 pontos, deixando para trás concorrentes tão fortes como as Doce, já na altura muito populares em Portugal.
A canção, uma crítica divertida, mas contundente, aos artistas que cantam em play-back, ficou em penúltimo lugar no Festival da Eurovisão, que se realizou nesse ano em Dublin, na República da Irlanda.

Carlos Paião - Play-Back Eurovisão 1981



Compositor, intérprete e instrumentista, Carlos Paião produziu mais de quinhentas canções, tendo sido homenageado em 2003, com um CD comemorativo dos 15 anos da sua morte.

Muitas são as canções que perduram na nossa memória.
Por exemplo «Pó de Arroz», composta em 1981

Carlos Paião | Pó de Arroz



ou a posterior «Cinderela»

Carlos Paião – Cinderela



A editora Valentim de Carvalho chegou a encomendar a Carlos Paião canções para outros intérpretes, entre eles Amália Rodrigues, para quem compôs, em 1982, «O Senhor Extra Terrestre», cuja letra chegou mesmo a constar dum manual para alunos da escola primária.

Carlos Paião partiu, mas perdura na nossa memória.
Saudades!... Grande Carlos! Que estejas sempre em paz!
Obrigado por tudo o que nos deixaste!!!

Deixo aqui, para quem quiser ler, a letra da canção «O Senhor Extra Terrestre»

Vou contar-vos um história
que não me sai da memória,
foi p’ra mim uma vitória
nesta era espacial.
Noutro dia estremeci
quando abri a porta e vi
um grandessíssimo ovni
pousado no meu quintal.
Fui logo bater à porta,
veio uma figura torta,
eu disse: se não se importa
poderia ir-se embora,
tenho esta roupa a secar
e ainda se vai sujar
se essa coisa aí ficar
a deitar fumo p’ra fora.
E o senhor extraterrestre
viu-se um pouco atrapalhado,
quis falar mas disse pi,
estava mal sintonizado.
Mexeu lá o botãozinho
e pôde contar-me então
que tinha sido multado
por o terem apanhado
sem carta de condução.

O senhor desculpe lá,
não quero passar por má,
pois você onde está
não me adianta nem me atrasa.
O pior é que a vizinha
que parece que adivinha
quando vir que estou sozinha
com um estranho em minha casa.
Mas já que está aí de pé
venha tomar um café,
faz-me pena, pois você
nem tem cara de ser mau
e eu queria saber também
se na terra donde vem
não conhece lá ninguém
que me arranje bacalhau.
E o senhor extraterrestre
viu-se um pouco atrapalhado,
quis falar mas disse pi,
estava mal sintonizado.
Mexeu lá no botãozinho,
disse para me pôr a pau,
pois na terra donde vinha
nem há cheiro de sardinha
quanto mais de bacalhau.

Conte agora novidades:
É casado? Tem saudades?
Já tem filhos? De que idades?
Só um? A quem é que sai?
Tem retratos com certeza,
mostre lá? Ai que riqueza,
não é mesmo uma beleza,
tão verdinho? sai ao pai.
Já está de chaves na mão?
Vai voltar p’ro avião?
Espere, que já ali estão
umas sandes p’ra viagem
e vista também aquela
camisinha de flanela
p’ra quando abrir a janela
não se constipar co’a aragem.
E o senhor extraterrestre
viu-se um pouco atrapalhado,
quis falar mas disse pi,
estava mal sintonizado.
Mexeu lá no botãozinho
e pôde-me então dizer
que quer que eu vá visitá-lo,
que acha graça quando eu falo
ou ao menos p’ra escrever.

E o senhor extraterrestre
viu-se um pouco atrapalhado,
quis falar mas disse pi,
estava mal sintonizado.
Mexeu lá no botãozinho
só p’ra dizer: Deus lhe pague.
Eu dei-lhe um copo de vinho
e lá foi no seu caminho
que era um pouco em ziguezague

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

ANITA

ANITA – EPISÓDIO IV

(Ficção baseada em factos reais)

…Comprou os selos, colou-os no envelope, e entregou a carta à funcionária, para que a fizesse seguir. Despediu-se com um breve “até logo”.
FIM DO 3º.EPISÓDIO

EPISÓDIO IV

A funcionária, com o envelope na mão, leu o endereço, reparando que era dirigido a um homem. Alguma coisa lhe dizia que algo estranho se passava, pois não tinha memória de alguma vez Anita ter escrito a um homem.
Hesitou, acabando por pôr a carta de lado.

À hora normal fechou o posto do correio. Dirigiu-se a casa de Anita, levando consigo a carta.
Foi recebida por Eulália, a quem, depois de muitos rodeios, acabou por contar o que passara nessa manhã, entregando-lhe a carta que não fizera seguir.

Logo que se encontrou só, a mãe de Anita fechou-se no seu quarto e, nervosamente, leu tudo o que a filha escrevera na noite anterior.
O seu espanto não tinha limites! Mal podia acreditar no que os seus olhos estavam vendo.
- Como é possível? - pensava.
Anita foi sempre uma filha tão obediente, respeitadora…
Como se atreve agora a rebelar-se desta maneira?
Como foi arranjar um namorado sem que eu ou o pai suspeitássemos de nada?
E quando foi que isso aconteceu?
Todas as vezes que veio cá de férias nada de anormal se notou no seu comportamento… Só pode ter sido neste último ano que passou na capital.

Sem saber que atitude tomar, optou por fingir que nada sabia. Falou com Anita com a naturalidade habitual, alvitrando sugestões para o vestido de casamento, a festa, os convites…

Quando à noite regressou a casa, Justino notou-lhe um certo nervosismo, que atribuiu à aproximação do casamento da filha. Uma sombra toldou-lhe o olhar, ao lembrar-se que iria perder a sua menina para outro homem.

O serão decorreu como habitualmente. A sós no quarto, finalmente Eulália pôde confiar ao marido o que tanto a preocupava. Receosa da sua reacção, contou-lhe brevemente como tinha a carta em seu poder.
Não esperava a frieza com que ele leu e releu a carta, e muito menos a sua observação:
- Temos que apressar o casamento. Amanhã mesmo irei falar com Vicente. Arranjarei uma desculpa qualquer para justificar tanta urgência. Entretanto, vamos proceder como se não soubéssemos de nada. Anita não pode desconfiar que descobrimos o seu segredo.

Nessa noite Anita conseguiu dormir descansadamente, convicta de que muito em breve Arnaldo haveria de descobrir uma forma de os libertar.
Lentos, os dias foram-se passando.
Fingia interesse pelos detalhes relacionados com o casamento, de que a mãe falava constantemente. Só à hora da chegada do correio se dirigia alvoroçada ao encontro do carteiro. Mas uma semana se passou, e a esperada resposta não chegava.

Começou então a ficar preocupada, nervosa. Não conseguia perceber tal silêncio.
Arnaldo não podia tê-la esquecido assim tão depressa. Ter-se-ia assustado com o rumo dos acontecimentos? Não teria coragem para assumir o seu amor contra a vontade de seus pais? Anita perdia-se em conjecturas, sem chegar a nenhuma conclusão.

Desesperada, escreveu nova carta, que teve o mesmo destino que a primeira – as mãos de Eulália.

Continuando sem respostas às suas cartas, aos poucos Anita foi-se convencendo que Arnaldo a esquecera, ou não teria coragem para assumir a responsabilidade de vir libertá-la do compromisso que seus pais haviam assumido para com Vicente.

Anita sentia-se desiludida. Fosse por um motivo ou por outro, afinal Arnaldo não era o homem que ela imaginara e com quem sonhara construir uma vida a dois.


Desde que começara o noivado Vicente ia todas as noites visitar a sua noiva.
Seguindo a tradição da época, sentavam-se na sala onde Eulália também se encontrava. Esta fingia-se absorvida pelos seus bordados. Uma vez por outra saía da sala por breves momentos, tentando favorecer um ambiente mais descontraído entre os noivos. Ela apercebia-se da tensão em que se encontrava a filha.

Vicente conversava longamente, expondo os seus planos para o que seria uma vida repleta de felicidade.
Anita ouvia-o, com um leve sorriso ausente, acenando, em sinal de concordância.
Havia, contudo, um ponto, em que Anita exigia que a sua vontade fosse respeitada.

domingo, 5 de outubro de 2008

BUNDA MOLE, É?

Os telespectadores portugueses, especialmente os que vêem ou viram novelas, lembram-se dela, com certeza, actuando em «A próxima vítima», «Olho no olho», «Brega e chique», entre outras.

Nascida a 1 de Maio de 1955, Patrícia Travassos é actriz e roteirista brasileira.
Começou a sua carreira artística pelo teatro, compôs canções e dirigiu espectáculos duma banda rock.
No cinema participou de roteiros e actuou nalguns filmes.

Actualmente apresenta, na televisão, o programa “Alternativa Saúde”, no canal GNT, e é cronista de revista Marie Claire.

O seu primeiro livro chama-se «Este sexo é feminino». É dele o excerto que partilho convosco.

Belinha acordou às seis, arrumou as crianças, levou-as para o colégio e voltou para casa a tempo de dar um beijo burocrático em Artur, o marido, a fim de trocarem cheques, afazeres e reclamações.
Fez um supermercado rápido, brigou com a empregada que manchou seu vestido de seda, saiu como sempre apressada, levou uma multa por estar dirigindo com o celular no ouvido e uma advertência por estacionar em lugar proibido, enquanto ia, por um minuto, ao caixa automático tirar dinheiro.
No caminho do trabalho batucava ansiedade no volante, num congestionamento monstro e pensava quando teria tempo de fazer a unha e pintar o cabelo antes que se transformasse numa mulher grisalha.
Chegando ao escritório, foi quase atropelada por uma gata escultural que, segundo soube, era a nova contratada da empresa, para o cargo que ela, Belinha, fez de tudo para pegar, mas que, apesar do currículo excelente e de seus anos de experiência e dedicação, não conseguiu.
Pensou se abdômen definido contaria ponto, mas logo esqueceu a gata, porque no meio de uma reunião ligaram do colégio de Clarinha, sua filha mais nova, dizendo que ela estava com dores de ouvido e febre.
Tentou em vão, achar o marido e, como não conseguiu,
Resolveu ela mesma ir até o colégio, depois do encontro com o novo cliente, que se revelou um chato, neurótico, desconfiado, e com quem teria que lidar nos próximos meses.
Saiu esbaforida e encontrou seu carro com pneu furado.
Pensou em tudo que ainda ia ter que fazer antes de fechar os olhos e sonhar com um mundo melhor.
Abandonou a droga do carro avariado, pegou um táxi e as crianças.
Quando chegou em casa, descobriu que tinha deixado a pasta com o relatório que precisava ler para o dia seguinte, no escritório!
Telefonou para o celular do marido com a esperança que ele pudesse pegar os papéis na empresa, mas o celular continuava fora de área.
Conseguiu, depois de vários telefonemas, que um “motoboy” lhe trouxesse os documentos.
Tomou um banho, deu o jantar para as crianças, fez os deveres com eles e os botou para dormir.
Artur chegou irritado de uma reunião em São Paulo, reclamando de tudo.
Jantaram em silêncio.
Na cama, ela leu metade do relatório e começou a bocejar de sono.
Quando estava quase pegando no sono, sentiu uma apalpadinha no traseiro com o seguinte comentário:
“-Tá ficando com a bundinha mole, Belinha... Deixa de preguiça e comece a se cuidar...”
Belinha olhou para o abajur de metal e se imaginou martelando a cabeça de Artur com ele.
Respirou três vezes profundamente, mentalizando a cor azul, e ponderou resolver agir com sabedoria.
No dia seguinte, não levou as crianças ao colégio, não fez um supermercado rápido, nem brigou com a empregada.
Foi para a academia e malhou duas horas!
De lá, foi para o cabeleireiro pintar os cabelos de acaju e as unhas de vermelho.
Ligou para o cliente novo insuportável e disse tudo que achava dele, da mulher dele e do projeto dele.
E aguardou os resultados da sua péssima conduta, fazendo uma massagem estética que jura eliminar, em dez sessões, a gordura localizada.
Enquanto se hospedava num “Spa”, ouviu o marido desesperado, tentar localizá-la pelo celular e descobrir por que ela havia sumido.
Pacientemente, ela não atendeu...
E, como vingança é um prato que se come frio, mandou um recado lacônico, para a caixa postal dele:
“-A bunda ainda está mole... Só volto, quando estiver dura...
Um beijo da preguiçosa!..”
Mulher não é um bicho inteligente?

Extraído do livro “Este sexo é feminino” de Patricia Travassos

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

QUASE ACREDITEI

Sofia Morgado é hipnoterapeuta profissional, diplomada pelo London College of Clynical Hypnosis, supervisora e tutora do Centro de Hipnose Clínica Ibérico (extensão do London College of Clynical Hypnosis em Portugal e Espanha).

Exerce a sua profissão em Lisboa e em Sobreda (margem sul)

Especializou-se na área das perturbações de ansiedade – stress, ataques de pânico, fobias, ansiedade generalizada, stress pós traumático, etc. – ajudando muitas pessoas, ao longo dos últimos oito anos, a resolver os seus problemas.

É autora de inúmeros artigos sobre desenvolvimento pessoal e relações inter-pessoais, muitos deles condensados no livro «Consciência do SER».

É da sua autoria o texto que partilho convosco.

QUASE ACREDITEI

Quase acreditei que não era nada, ao me tratarem como nada.


Quase acreditei que não seria capaz, quando me chamavam por acharem que eu não era capaz.

Quase acreditei que não sabia, quando me perguntavam por acharem que eu não sabia.

Quase acreditei ser diferente, entre tantos iguais, entre tantos capazes e sabidos, entre tantos que eram chamados e escolhidos.

Quase acreditei estar de fora, quando me deixavam de fora, porque…que falta fazia?

E de quase acreditar, adoeci.

Busquei ajuda com doutores, mestres, magos e querubins.

Procurei a cura em toda a parte, e ela estava tão perto de mim!


Me ensinaram a olhar para dentro de mim mesmo, e perceber que sou exactamente como os iguais que me faziam diferente.

E acreditei profundamente em mim.


E tenho de, como dívida com a vida, fazer com que cada ser humano se perceba, se ame, se admire de si mesmo, como verdadeira fonte de riqueza.

Foi assim que cresci: acreditando.

Sou exactamente do tamanho de todo o ser humano.

E, por acreditar, perdi o medo de dizer, falar, participar, e até de cometer enganos.


E se errar…paciência!

Continuo vivendo e, por isso, aprendendo.


Errar é Humano!

(Sofia Morgado e José Varela)