sexta-feira, 14 de setembro de 2012

CENAS DA VIDA REAL


NAS MATAS DE SEIÇA

Tinha começado a escrever este texto em princípios de Maio, com vista à sua publicação depois dos dias “da Mãe”, em Portugal, e “das Mães”, no Brasil. Tinha escrito sensivelmente metade quando deixei de ter oportunidade de continuar devido ao agravamento do estado de saúde do meu marido.
O que se seguiu depois é já do vosso conhecimento.
 
Tenho lutado, dia a dia, por reunir forças para encarar esta minha nova realidade, com a qual terei que conviver até ao fim dos meus dias.
Decidi, pois, retomar a feitura do meu livro. Será como que uma homenagem ao meu marido, que tanto me incentivou, ajudando-me, até, nalguns pormenores em que me surgiam dúvidas. Ele sonhava, tanto como eu, com a publicação do que será (se Deus me der forças para tal) a recordação das minhas memórias de África, dos tempos, inolvidáveis, que lá vivemos.
Devo-lhe este livro!
 
Como que um exercício para retomar o hábito da escrita resolvi acabar este texto. E publicá-lo. Outros se seguirão, assim o espero. Não serão, por certo, muito frequentes, mas sê-lo-ão tanto quanto possível.
 
A todos quantos, entretanto, me visitaram, transmitindo-me conforto e carinho, quero, publicamente, expressar o meu agradecimento: MUITO OBRIGADA!
 
E agora o texto:
 
NAS MATAS DA RIBEIRA DE SEIÇA
 
No meu post de 14 de Abril falei-vos do Mosteiro de Santa Maria de Seiça, em cuja capela, octogonal, existem pinturas relacionadas com várias lendas.
Quando estava a escrever esse texto lembrei-me de um incidente ocorrido quando eu era uma jovenzinha de catorze anos, na época em que conheci o meu amigo Rosindo, e que teve como cenário as matas da Ribeira de Seiça.
A minha Mãe gostava muito de animais, indo a sua preferência para gatos. Eu sempre gostei mais de cães, mas a minha Mãe não podia viver sem gatos.
Entre os vários que teve ao longo da sua vida, houve uma gatinha branca, que ela apelidou de Ritinha. Um belo dia nasceram gatinhos, sendo que um dos pequeninos era branquinho de neve, tal como a mãe. Foram todos distribuídos pela vizinhança, mas o branquinho ficou lá em casa. E, como não podia deixar de ser, passou a chamar-se Ritinho.
Passado algum tempo era um belo gato. Todo branquinho, sempre impecavelmente limpo, enormes olhos azuis, um lindo animal. Cheguei a dizer à minha Mãe que devia tê-lo baptizado de “Branco de Neve”. Até costumava dizer, de brincadeira:
- Lá vai o Ritinho com a sua capa de arminho.
Um dia a minha Mãe chamou-o para comer, mas o Ritinho não apareceu. Estranho! À hora da refeição já ele costumava andar por ali a rondar…
Mas nada de preocupações – foi dar um giro.
Porém, as horas passaram, e o Ritinho não apareceu. A minha Mãe correu a vizinhança, perguntando a toda a gente se tinham visto o seu Ritinho. Não, ninguém lhe tinha posto a vista em cima.
Chegou a noite e o Ritinho sem aparecer.
Acredito que a minha Mãe não tenha dormido nada bem essa noite, tal era a preocupação com a falta do Ritinho.
No dia seguinte passou lá por casa um homem dizendo que tinha visto um gato branco nas matas da Ribeira de Seiça.
A minha Mãe disse logo, dirigindo-se a mim:
- Vamos lá procurá-lo.
Eu limitei-me a obedecer, embora a distância da nossa casa às matas devesse andar pelos 5 ou 6 quilómetros.
Depois de lá chegarmos “corremos montes e vales”, com a minha Mãe sempre chamando: Ritinho! Ritinho! Mas o gatinho não aparecia. Entretanto, avistámos a Capela, e logo me veio à ideia a descoberta do tal livrinho antigo no sótão da casa do Sr. Curado, e a enorme quantidade de lendas relacionadas com o Mosteiro e sua construção.
Propus à minha Mãe fazermos uma pausa, pois já tínhamos passado mais de metade da manhã nas buscas do felino, e as pernas acusavam um certo cansaço.
Escolhemos umas pedras arredondadas no meio de grandes fetos, sentamo-nos, e eu “ataquei” logo:
- Mamã, conhece alguma lenda relacionada com o Mosteiro de Seiça?
Resposta pronta:
- Conheço muitas. Queres que te conte alguma, enquanto descansamos?
Não queria eu outra coisa! Sempre adorei lendas, e continuo a gostar muito (saí à minha Mãe...)
- Vou então contar-te a lenda em que entra o nosso primeiro rei, D. Afonso Henriques.
 
Lenda da cura miraculosa do pajem de D. Afonso Henriques
 
“Contavam os antigos que um certo dia D. Afonso Henriques andava à caça aqui nas matas de Seiça, quando um pajem que o acompanhava, caiu do cavalo e morreu.

 (Pajem de D. Afonso Henriques caindo do cavalo)
Um dos quadros existentes na Capela de Seiça
 
Nessa altura apenas existia, próximo, uma pequena ermida, para onde transportaram o corpo do nobre cavaleiro. Quando se preparavam para o sepultar, de repente o jovem nobre abriu os olhos e voltou à vida.

(Cura miraculosa do mesmo pajem)
Outro dos quadros existentes na Capela de Seiça
 
Essa cura miraculosa - porque foi um milagre - foi logo atribuída a Nossa Senhora de Seiça. Por isso D. Afonso Henriques mandou construir, ali perto, um Mosteiro em honra de Santa Maria de Seiça.”
 
 
Esta é uma das muitas lendas que eu conheço sobre o Mosteiro de Seiça - disse a minha Mãe. Mas agora não há tempo para mais lendas. Vamos continuar a procurar o meu gatinho.
Continuámos até à hora do almoço, mas em vão. O Ritinho apareceu no dia seguinte, em casa, cheio de ervas secas agarradas àquele pelinho maravilhoso, que agora pouco tinha de “branco de neve”.
  
Oportunamente contarei outras das várias lendas do Mosteiro de Seiça.